terça-feira, 6 de maio de 2025

O Parque Indígena do Xingu PIX

 


Para evidenciar a riqueza da nossa cultura ancestral, despertar o interesse dos jovens estudantes e evitar estigmatizar indivíduos, decidi abordar cada etnia por meio da Toy Arts (saiba mais sobre o trabalho das etnias na Toy Art), na qual reproduzi detalhadamente mais de 240 etnias que habitam o território brasileiro, com informações detalhadas sobre cada etnia, respeitando aspectos de sua cultura material, modo de vida, produção de artigos para uso nas aldeias, padrões de pintura corporal (estudada em detalhes para cada etnia) e sua relação com o seu universo coletivo. 

Reproduzo aqui um dos artigos em que falo sobre o Parque Indígena do Xingu.

O Parque Indígena do Xingu, anteriormente Parque Nacional Indígena do Xingu, é uma terra indígena brasileira, considerada a maior e uma das mais famosas reservas do gênero no mundo. Criado em 1961 pelo então presidente brasileiro Jânio Quadros, foi a primeira terra indígena homologada pelo governo federal. Seus principais idealizadores foram os irmãos Villas Bôas, mas quem redigiu o projeto foi o antropólogo e então funcionário do Serviço de Proteção ao Índio, Darcy Ribeiro.

Com uma área de 2.642.003 hectares, o Parque está situado no norte do estado de Mato Grosso, numa zona de transição entre os biomas de cerrado e amazônico. A região, toda ela plana, é caracterizada pela predominância de matas altas entremeadas de cerrados e campos, sendo cortada pelos formadores do Rio Xingu e por seus primeiros afluentes da direita e da esquerda. Os cursos formadores são os rios Kuluene, Tanguro, Kurisevo e Ronuro - o Kuluene assume o nome de Xingu a partir da desembocadura do Ronuro, no local conhecido pelos indígenas como Mÿrená (Morená). Os afluentes são os rios Suiá Miçu, Maritsauá Miçu, Auaiá Miçu, Uaiá Miçu e o Jarina, próximo da cachoeira de Von Martius.

O Parque Indígena do Xingu é considerado a maior e uma das mais famosas reservas do gênero no mundo. Criado em 1961, durante o governo de Jânio Quadros, foi resultado de vários anos de trabalho e luta política, envolvendo os irmãos Villas-Bôas, ao lado de personalidades como o Marechal Rondon, Darcy Ribeiro, Noel Nutels, Café Filho e muitos outros

Historia

A história do Parque Nacional do Alto Xingu remonta à à pré-história da região até a chegada dos europeus e além. Entre os anos 800 e 1400, os ancestrais dos atuais Aruak xinguanos estabeleceram-se na área, evidenciados por cerâmicas características e aldeias circulares. Durante os séculos seguintes, surgiram grandes aldeias fortificadas, indicando uma população densa e organizada. No entanto, a presença europeia trouxe mudanças, incluindo incursões bandeirantes e confrontos, até a primeira visita documentada de Karl von den Steinen em 1884. Esse período também testemunhou a chegada de outros grupos étnicos, como os Tupi Kamayurá e Aweti, consolidando a diversidade étnica no Alto Xingu.

Após as expedições iniciais de Karl von den Steinen, a região do Alto Xingu passou por uma série de transformações com a chegada de outros pesquisadores e exploradores, que trouxeram consigo não apenas conhecimento, mas também influências e impactos significativos para os povos indígenas da região. No entanto, foi a partir da década de 1940 que a presença dos irmãos Villas Bôas marcou uma nova era na história do Parque Indígena do Xingu.

A Fundação Brasil Central (FBC), liderada pelos irmãos Villas Bôas, desempenhou um papel fundamental na proteção e promoção dos interesses dos povos do Xingu. Em contraste com outras regiões do Brasil, onde a presença indígena muitas vezes era vista como um obstáculo ao progresso, os Villas Bôas reconheceram a importância de preservar a cultura e os modos de vida dos habitantes do Parque.

Orlando Villas Bôas, em particular, assumiu a direção da FBC e implementou uma série de políticas destinadas a garantir a integridade e autonomia das comunidades indígenas. Uma das iniciativas mais importantes foi o estabelecimento de um programa de assistência médica em parceria com a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), que continua até os dias atuais. Esse programa não apenas proporcionou cuidados de saúde essenciais, mas também ajudou a fortalecer os laços de confiança entre os índios e os agentes da FBC.

Além disso, os Villas Bôas lideraram esforços para demarcar as terras indígenas e proteger o Parque contra as ameaças externas, como a exploração madeireira, a mineração e a expansão agrícola. Suas ações foram guiadas por uma visão de que os povos do Xingu representavam "índios de cultura pura" e que seu modo de vida deveria ser preservado a todo custo.

No entanto, a abordagem paternalista dos Villas Bôas também gerou controvérsias, especialmente em relação à transferência de alguns povos para o Parque, como os Kaiabi, Ikpeng, Tapayuna e Panará. Embora essas ações tenham sido tomadas com a intenção de proteger as comunidades indígenas, alguns críticos argumentaram que elas limitaram a autonomia e liberdade dos próprios índios.

Apesar das críticas, a gestão da FBC sob os Villas Bôas conseguiu criar um ambiente relativamente isolado para os povos do Xingu, protegendo-os das influências externas que poderiam comprometer sua cultura e modos de vida tradicionais. Ao mesmo tempo, promoveu uma nova postura de respeito e valorização das comunidades indígenas por parte da sociedade nacional e internacional.

As Etnias que Vivem no Xingu

Entre os anos 1400 e 1600, surgiram grandes aldeias fortificadas, indicando uma densa população e influências de outras culturas. A presença europeia e as incursões bandeirantes a partir de 1750 marcaram um período de desafios e mudanças para as comunidades indígenas.

Grupos Maiores

EtniaPopulaçãoGrupo LinguísticoObs
Aweti195Tupi-Gaurani
Ikpeng459Karibconhecidos como Txikão
Kalapalo855Karib
Kamaiurá467Tupi-Gaurani
Kawaieté (Kaiabi)1193Tupi-Gaurani
Kisedjê (Suya) 330
Kuikuro653Karib
Yudjá (Juruna)348Juruna
Mehinako254Arauak
Yawalapití156Arauak
Waurá409Arauak
Grupos Menores e Kayapó

Matipu149Karib
Nafukuá126Karib
Trumai97Trumai
Tapayuna60Tapayuna
Naruvôtu69Karib
Kayapó 6365Kayapô*não faz parte do parque do Xingu
Ao longo dos anos, as etnias do Xingu mantiveram suas tradições, enfrentaram desafios e adaptaram-se às mudanças, preservando sua identidade e contribuindo para a diversidade cultural do Brasil.

Vamos dar uma olhada mais detalhada nas 16 etnias que habitam o Parque Indígena do Xingu e seu contexto:


1- Kayapó, Começando pelo norte do Parque, a etnia que melhor representa o parque, más que ironicamente não está dentro das limitações do mesmo, principalmente por sua mais forte liderança, é a dos Kayapo, cuja o principal representante Metyktire é o cacique Raoni.

Mesmo que a Terra Indígena Kayapó não faça parte do Parque Indígena do Xingu, sua localização na fronteira norte do parque, no estado do Pará, tem grande importância para a reserva indígena. A Terra Indígena Kayapó abrange uma área significativa onde vivem diversas comunidades da etnia Kayapó, incluindo as divisões Metyktire, Kremoro e outras.

Embora não faça parte do Parque Indígena do Xingu, a Terra Indígena Kayapó compartilha muitas semelhanças culturais e históricas com as comunidades que habitam o Xingu. Ambas as regiões são importantes para a preservação da cultura indígena e para a conservação da biodiversidade amazônica.

Falantes do idioma pertencente ao grupo linguístico Jê, os Kayapó estavam divididos em três grandes grupos, os Irã'ãmranh-re ("os que passeiam nas planícies"), os Goroti Kumrenhtx ("os homens do verdadeiro grande grupo") e os Porekry ("os homens dos pequenos bambus"). Destes, descendem os sete subgrupos kayapó atuais: Gorotire, Kuben-Krân-Krên, Kôkraimôrô, Kararaô, Mekrãgnoti, Metyktire e Xikrin, que habitam o norte do Parque Indígena do Xingu:

Metyktire: Esta divisão dos Kayapó é uma das mais conhecidas e estudadas. Localizada no norte do Parque Indígena do Xingu, Metyktire é uma das aldeias mais importantes e influentes da região. Os Metyktire mantêm uma forte identidade cultural e são conhecidos por sua habilidade em artesanato, como a produção de cestaria e objetos de madeira entalhada. Sua liderança tem desempenhado um papel significativo na defesa dos direitos indígenas e na preservação ambiental.

Kremoro: Outra divisão dos Kayapó que habita o norte do Xingu é Kremoro. Embora talvez não seja tão proeminente quanto Metyktire, Kremoro ainda desempenha um papel importante na comunidade Kayapó. Eles compartilham muitas das tradições e práticas culturais dos Metyktire, mas também têm suas próprias nuances e identidade única dentro do grupo Kayapó.

Xikrin: Os Xikrin, também conhecidos como Kayapó do Cateté, são uma divisão dos Kayapó que habita a região nordeste do Parque Indígena do Xingu, na Terra Indígena Trincheira Bacajá. Eles têm uma história rica e uma cultura vibrante, conhecida por sua cerâmica tradicional e suas habilidades na produção de artesanato. Os Xikrin também são ativos na defesa de seus direitos territoriais e na luta pela preservação ambiental.

Cada uma dessas divisões dos Kayapó contribui para a diversidade cultural e étnica do Parque Indígena do Xingu, desempenhando papéis únicos na comunidade e na preservação da identidade cultural e dos direitos indígenas.
 

2-Kalapalo: Os Kalapalo também viram flutuações em sua população ao longo dos anos. Originários da região, eles mantiveram uma presença significativa no Xingu, enfrentando desafios como epidemias e conflitos, mas também contribuindo para a diversidade cultural da área.


3-Kamaiurá: Com uma história que remonta ao século XIX, em 1946 passam a ter contatos regulares com os membros da expedição Roncador-Xingu, liderada pelos irmãos Villas-Bôas. Finalmente, em 1961, o território que habitam converte-se e Parque Nacional, hoje subordinado à Funai (Fundação Nacional do Índio).

A Casa Antropomorfa Kamayurá

Uma estrutura bem conhecida no Parque do Xingu é a casa antropomorfa Kamayurá é mais do que apenas uma estrutura física; é um símbolo vivo da cultura e tradição profundamente enraizadas dos Kamayurás e Yawalapitis. Sua construção não apenas proporciona abrigo, mas também fortalece os laços comunitários e transmite conhecimento ancestral de geração em geração.


Enquanto os homens trabalham na construção física da oca, as mulheres desempenham um papel igualmente importante na preparação dos alimentos e no apoio logístico. Essa divisão de trabalho não apenas demonstra a complementaridade de papéis de gênero na sociedade Kamayurá, mas também destaca a interdependência e cooperação entre os membros da comunidade.

Além de ser um local de convívio e celebração, a Casa Antropomorfa Kamayurá serve como palco para rituais, cantos e danças sagradas que conectam os Kamayurás com seus ancestrais e o cosmos. Sob o céu estrelado, esses povos compartilham histórias, ensinamentos e memórias.


4-Kuikuro: Com sua população sofrendo altos e baixos ao longo dos anos. Os Kuikuro habitavam, em 2004, três aldeias. A aldeia principal e maior era Ipatse, pouco distante da margem esquerda do médio Culuene, onde viviam mais de 300 pessoas. Em 1997, surgiu a aldeia de Ahukugi, na margem direita do Culuene, rio acima de Ipatse, com cerca de 100 pessoas. Em seguida, formou-se uma terceira aldeia no local da antiga Lahatuá, com um grupo familiar de uma dezena de pessoas.Sua presença na região contribui para a diversidade cultural e para a compreensão da história e dos desafios enfrentados pelas comunidades indígenas.


5-Matipu: Originários da região, os Matipu são conhecidos no parque pelos gritos matinais dos homens, uma característica marcante de sua cultura O contato com a sociedade não indígena e esforços de preservação cultural estão intimamente ligados à sua história e a do Parque Indígena do Xingu.


6-Mehinako: Até onde se tem conhecimento, os Mehinako sempre viveram na bacia do Xingu, na região dos rios Tuatuari e Kurisevo. A primeira aldeia de que se tem registro é Yulutakitsi, que deve ter sido habitada há 150 anos ou mais em localidade incerta, enfrentando desafios semelhantes aos de outras etnias da região. Sua história e cultura são uma parte importante do tecido cultural do Parque.


7-Nahukwá: Com uma história que remonta ao século XIX, os Nahukuá compõem o mais diminuto dos grupos que integram a área cultural conhecida como Alto Xingu, sua presença no Xingu contribui para a diversidade cultural e para a compreensão da história da região. Quando Karl von den Steinen esteve nessa área, em 1884 e 1887, os Nahukuá-Kalapalo-Kuikuro, então reconhecidos como um único povo, eram um dos grupos mais numerosos e estavam distribuídos em nove aldeias. Paul Ehrenreich, que acompanhou Von den Steinen em sua segunda expedição, afirma que uma aldeia nahukuá localizava-se no rio Kurisevo e que, nessa mesma época, seis ou oito aldeias mais se distribuíam ao longo do rio Kuluene.


8-Trumai: Os Trumai são considerados o último grupo a ter chegado na área dos formadores do Rio Xingu, tendo atingido a região na primeira metade do século XIX. A língua Trumai é considerada isolada, isto é, não apresenta parentesco genético com nenhuma outra língua do Xingu, nem com outras famílias lingüísticas brasileiras. A situação atual do Trumai é um pouco sensível, pois não há muitos falantes. A maioria das crianças já fala o Português como primeira língua; algumas delas também dominam outras línguas xinguanas, como o Kamayurá, o Aweti ou o Suyá.


9-Waurá ou Wauja: Os Waurá são notórios pela singularidade de sua cerâmica, o grafismo de seus cestos, sua arte plumária e máscaras rituais. Além da riqueza de sua cultura material, esse povo possui uma complexa e fascinante mito-cosmologia, na qual os vínculos entre os animais, as coisas, os humanos e os seres extra-humanos permeiam sua concepção de mundo e são cruciais nas práticas de xamanismo.

Desde os tempos primordiais, quando a escuridão envolvia o mundo, os Waurás acreditavam na existência de seres antropomorfos ou zooantropomorfos, conhecidos como yerupoho, que habitavam a superfície da terra juntamente com os humanos. Esses seres eram dotados de uma ambiguidade que os tornava simultaneamente gente e animal, artefato ou fenômeno natural.

A chegada iminente do sol representava uma ameaça para os yerupoho, que se lançaram em frenética atividade para se proteger, criando indumentárias e máscaras para se transformarem em apapaatai, seres sobrenaturais invisíveis e visíveis. Aqueles que conseguiram vestir suas indumentárias a tempo tornaram-se apapaatai visíveis, enquanto os que ficaram "nus" foram transformados em apapaatai iyajo, seres perigosos que representavam uma ameaça para os humanos.


A ontologia (área da filosofia que estuda a natureza do ser, da existência e da realidade) dos Waurás abrange três macrocategorias de seres: os iyãu (seres humanos), os mona (animais, plantas e artefatos) e os kumã (monstros). Os kumã são dotados de uma natureza extraordinária e podem ser tanto apapaatai quanto yerupoho. A relação entre esses seres é complexa e baseia-se na noção de "roupa" (nai), que permite aos yerupoho se transformarem em apapaatai através de uma variedade de formas animais, vegetais ou minerais.

Essa relação tríadica entre yerupoho, apapaatai e os seres do mundo natural constitui a base da cosmografia waurá, onde cada ser é percebido como co-extensivo, compartilhando uma mesma alma (paapitsi). Essa co-extensão implica que os perigos dos seres sobrenaturais também estão presentes na dimensão visível dos seres do mundo natural, criando uma fronteira tênue entre o ordinário e o extraordinário, o visível e o invisível.


10-Yawalapiti: Yawalapiti significa "aldeia dos tucuns", a localização mais antiga de que se recordam e está situada entre o Posto Diauarum e o travessão Morená (sítio próximo à confluência dos rios Kuluene e Batovi). 

Os Yawalapiti são reconhecidos pelos seu incríveis instrumentos musicais, associados a rituais e festas, dentre estas incluem a flauta Uruá, tocada somente por homens, sendo-lhe atribuído o poder de afastar os maus espíritos antes do Kuarup, com cerca de dois metros, feita de bambu, composta por dois tubos sem furos atados de tamanhos diferentes, soprados de forma alternada.


Além dos instrumentos de sopro, os Yawalapiti também utilizam uma variedade de instrumentos de percussão, que dentro do parque tem vários nomes, dependendo da etnia que os usa. É o caso do uay (ou oapy ou uapi), um tambor típico e os classícos mbarakás nome tupi para as marácas, que ganham outras versões em idiomas diferentes, como o mutomburé, o cutõe e o cotecá. E por fim os isntrumentos de percussão, como o Ngo-Kon, a maraca ou chocalho dos Kayapo-Xikrin.

Ritual do Pomeri, home com o rosto coberto por resina e penas de aves

11-Ikpeng: Vieram para a região do Xingu ainda no século XX, quando guerreavam com os habitantes locais. O contato com o homem branco se deu no início da década de 60, e teve conseqüências desastrosas para sua população, que foi reduzida em menos da metade em razão de doenças e assassintos.

O ritual do Pomeri é a principal festa de iniciação masculina, uma festa marcada pela tatuagem dos rostos dos meninos, e seu significado e práticas ritualísticas são fundamentais para a cultura e a cosmologia desse povo.

Durante o ritual do Pomeri, os meninos Ikpeng têm seus rostos tatuados como parte do processo de iniciação na vida adulta. O ritual começa com várias sessões de dança e é seguido por uma grande caçada, na qual os pais das crianças participam como donos da festa. Após aproximadamente um mês, um mensageiro retorna à aldeia anunciando o retorno dos caçadores. No dia seguinte, durante uma sessão de danças ao som de flautas e canto do cacique, os caçadores retornam com uma grande quantidade de caça, especialmente macacos.

Durante o ritual, os participantes revestem seus corpos com resina de madeira e penas de aves, realizam danças e consomem alimentos como mingau de perereba doce. Na última manhã da festa, as crianças são tatuadas. Incisões são feitas nos rostos das crianças com espinhos de tucum, e carvão é aplicado nas incisões, resultando na tatuagem.

Além do ritual do Pomeri, os Ikpeng também adotaram outras festas e práticas rituais do Alto Xingu, como o Tawarawanã e o Yamurikumã. Esses rituais são importantes para a identidade cultural e espiritual dos Ikpeng, refletindo suas crenças, valores e modo de vida.

A confusão entre humano e animal durante o ritual, como representado pelas máscaras de polpa de bambu que os dançadores usam para cegar a si mesmos, é uma característica importante da cosmologia Ikpeng. Isso reflete sua concepção complexa de identidade e sua compreensão da relação entre humanos e o mundo natural ao seu redor.



12-Kaiabi (ou Kawaieté) - A origem do nome Kaiabi perde-se no tempo e hoje os próprios índios não sabem dizer de onde surgiu e qual seu significado. É provável que seja a forma pela qual os Apiaká ou os Bakairi, que representam as primeiras fontes de informação sobre os Kaiabi no século XIX, a eles se referiam. Certamente não se trata de auto-denominação do grupo. Georg Grünberg, um etnógrafo que pesquisou os Kaiabi nos anos 60, sugere que a auto-denominação seja o termo iputunuun, que significa algo como "o nosso pessoal".

Ficaram conhecidos pelo incidente em 1983, no qual para reivindicar melhor atendimento da Funai eles interceptaram um avião no Posto Diauarum, localizado no Baixo Xingu, os Kawaieté têm uma história longa na região, enfrentando desafios como a pressão de frentes de expansão econômica ao longo dos anos. Sua presença no Xingu contribui para a diversidade cultural e para a compreensão da história do Parque.


13-Yudjá: Os Yudjá têm uma história marcada por sua habilidade como canoeiros, ameaçada por projetos de implantação de complexos hidrelétricos na região, preservam seu idioma natural, pertencente ao tronco Tupi-Guarani e nem todos os homens com mais de 50 anos dominam o português e talvez apenas a metade das mulheres adultas tenha dele uma compreensão razoável.

O nome Juruna ou Yudjá sediferem dos dois outros nomes par os humanos,  os Abi “Índios”, em idioma juruna incluem todos os povos indígenas que nem são falantes do juruna, e os Karaí, homens brancos.

Membro da etnia Kisêdjê vestido para celebrar a festa do rato - Amtô

14-Suyá: Os Suyá ou Kisêdjê são os únicos representantes do grupo linguistico Jê no PIX, desde sua chegada na região, provavelmente na segunda metade do século XIX, seu contato com outros povos xinguanos e, principalmente, com aqueles da chamada área cultural do Alto Xingu, ocasionou a incorporação de muitos costumes e tecnologias alheias. 

Más nunca abriram mão da sua singularidade cultural, cujo principal emblema pode ser reconhecido num estilo particular de canto ritual, expressão máxima das individualidades e do modo de ser da sociedade Kisêdjê. Até algumas décadas atrás, outro marco diferencial do grupo eram os grandes discos labiais e auriculares que, mais do que ornamentos, apontavam a importância do cantar e do ouvir para esse povo.


15-Aweti: Também conhecidos conhecidos como “Auetö”, tradicionalmente, exercem um importante papel entre os povos alto-xinguanos como intermediários na circulação de notícias ou bens e como anfitriões para os viajantes, mas a perda populacional catastrófica sofrida nas primeiras décadas do século XX, que quase resultou no seu desaparecimento como grupo, fez com que sua presença na área se tornasse menos visível. 

Certamente, os Aweti constituem o povo menos conhecido do Alto Xingu, e o mesmo vale para sua língua, com a recuperação populacional, no entanto, os Aweti retomam muito da vida cultural tradicional e têm procurado marcar presença na atual sociedade alto-xinguana.


segunda-feira, 28 de abril de 2025

RPG dos Heróis da Bruzundanga - Gamificação Para Aculturamento do Cauim Tiakau

Visconde de Quaresma servindo Cauim Carauna em sua mansão, réplica idêntica do Museu do Ipiranga no Rio de Janeiro

Uma aventura tupi-canibal para divulgar o Cauim Tiakau

RPG e Gameficação

O objetivo deste artigo é analisar os efeitos da gamificação como estratégia de aculturação para o Cauim Tiakau, utilizando um jogo de RPG baseado nos Heróis da Bruzundanga, bem como apresentar o jogo e sua dinâmica. 

A trama se passa em um futuro alternativo do Brasil, masi exatamente no ano de 2093, onde e quando a cultura tupi é amplamente valorizada e o país alcançou um nível elevado de prosperidade.

A gamificação no marketing é uma abordagem eficaz que transforma interações cotidianas com a marca em experiências divertidas e engajadoras. Ela consiste em aplicar elementos de design de jogos — como pontos, distintivos e desafios — às atividades de marketing, estimulando o envolvimento e a fidelização.

Dentro do jogo, há uma etapa especial de degustação de cauim, na qual os participantes experimentam a bebida enquanto aprendem sobre seu processo de produção tradicional com nomenclaturas em tupi antigo. Esse momento é integrado à narrativa de forma a reforçar o contexto histórico e cultural da bebida, promovendo a valorização das raízes indígenas brasileiras.

 


Base de Estratégia

Para criar a dinâmica do jogo, foi necessário um extenso processo de estudo e pesquisa. Não apenas resgatei minha experiência prática com jogos de RPG, que tive na virada dos anos 2000, como também mergulhei no estudo dos principais teóricos de gamificação aplicada ao marketing. Essa base teórica e prática foi essencial para estruturar uma experiência que fosse, ao mesmo tempo, divertida, envolvente e alinhada aos objetivos de aculturação e valorização cultural do projeto Cauim Tiakau.

Aqui estão três autores cujos trabalhos em gamificação se aproximam bastante da proposta do Cauim Rerekoara, especialmente por envolverem narrativas envolventes, experiências culturais imersivas e interação social significativa:

1. Gabe Zichermann

Obra principal: Gamification by Design

Relevância: Zichermann é um dos principais nomes da gamificação. Ele destaca o uso de jogos para engajar pessoas emocionalmente, algo essencial no seu projeto, que une storytelling, identidade cultural e participação ativa.

2. Jane McGonigal

Obra principal: Reality is Broken

Relevância: Jane defende que jogos podem ser usados para melhorar o mundo real. O seu jogo, que resgata o cauim e a história dos povos originários, está diretamente alinhado com essa ideia de experiência transformadora com impacto cultural.

3. Sebastian Deterding

Obra principal: Diversos artigos sobre gameful design e experiências significativas

Relevância: Deterding se aprofunda em como criar experiências com significado e imersão. Ele defende que jogos precisam ter coerência com o contexto cultural e emocional do jogador, algo que você já aplica ao conectar o jogo com os Heróis da Bruzundanga e o cauim.

Além do live action (veja post anterior), um jogo de RPG com os personagens pode ser uma opção para divulgar a cultura tupi, o cauim e prinicpalmente o idioma tupi antigo. Os idiomas indígenas como a língua geral paulistana, a língua brasílica, o nheengatu, entre outras variações do tupi antigo, eram as mais faladas em todo o território brasileiro, enquanto a língua portuguesa era minoritária, falada apenas por europeus, até a proibição das línguas indígenas pelo Marquês de Pombal,  em seu diretório de 3 de maio de 1757. 

Este diretório buscava não apenas corrigir o inócuo decreto de 7 de junho de 1755, que havia transferido a jurisdição temporal para os próprios chefes indígenas, mas também determinar visivelmente a expulsão dos jesuítas, particularmente visados ​​por este documento. Uma vez confirmado e convertido em lei pelo decreto de 17 de agosto de 1758, o ensino do português e do tupi nas missões jesuíticas foi proibido.

Dessa forma, a produção do Cauim, o estudo do idioma Tupi Antigo, bem como todas as formas de resgate cultural, tornaram-se, desde então, ferramentas de valorização cultural e autodeterminação nacional.

Tabuleiro do Jogo
Objetivo do Jogo

Este é um jogo de RPG com fins de gamificação e degustação para promover o Cauim Tiakau, uma bebida ancestral renascida com propósito.
No final da partida, o jogador vencedor recebe como prêmio uma garrafa de Cauim Tiakau.

Formato

Jogadores: de 12 a 50 participantes
Duração: aproximadamente 1 hora
Estilo: Role-Playing Game (RPG) com cartas e narrativa interativa
Temática: sátira política, misticismo tupi e combate simbólico entre civilização e barbárie

Materiais

50 Cartas de Personalidade
Cada carta apresenta 4 atributos com pontuação de 1 a 20:
Potência em Batalha
Capacidade de Defesa
Inteligência
Equilíbrio Emocional

3 Cartas de Roteiro (com a trama central da sessão)
10 Cartas de Ação (eventos aleatórios que alteram o jogo)
Muitas peças de GO (utilizadas como valor monetário — chamadas de “Contas”)
Cada jogador começa com 10 Contas

Fase 1: Preparação

Cada jogador recebe uma Carta de Personalidade, dividida entre Protagonistas (heróis) e Antagonistas (vilões) em número equilibrado.

Caso o jogador não goste da carta, pode trocar uma única vez.

As personalidades são explicadas na apresentação inicial.
Apresenta-se o contexto histórico e cultural do Cauim Tiakau, Os Bruzundangas e associação com obras de Lima Barreto, sua origem e importância.

Divide-se a sala em dois grandes grupos: Protagonistas e Antagonistas.

Fase 2: Apresentação do Roteiro

Exemplo de roteiro para a primeira partida:

Trama – A Toxina da Infância Eterna
A Bruzundanga vive o caos. Após um golpe de estado, os fanáticos da ordem secreta Tupi Rerekoara tomam o poder. Eles revivem práticas canibais, tomam o judiciário e impõem uma toxina misteriosa que impede a puberdade — criando uma população de adultos infantilizados e controláveis.

Os heróis Assum Preto, Mani e Quaresma são convocados para investigar o plano, iniciando uma jornada que revelará segredos profundos sobre poder, ancestralidade e manipulação de consciências.

Fase 3: Escolhas Táticas

Os jogadores se organizam em grupos de acordo com suas cartas:

Ex: Quem tirou Quaresma (carta 03) lidera os protagonistas.
Quem tirou Yara (carta 09) lidera os antagonistas.

Cada grupo decide em conjunto quem revelará a próxima Carta de Ação.

O grupo dos antagonistas escolhe seu exército secreto (Ex: Exército Formiga Fujoshi).

Aqui, os grupos escolhem secretamente quanto pagarão a Fujoshi, em valores que podem variar de 2 a 10 CONTAS. As disputas sempre serão vencidas pelo exército que pagar mais. Se o grupo que se sente oprimido decidir pagar mais a Fujoshi, poderá fazê-lo. Quem paga mais sempre vence.

O personagem “Manda Chuva” contrata Quaresma, pagando 5 Contas.

O pagamento pode vir do próprio bolso ou por meio de doações de aliados.

Cartas das Personalidades Principais


CARTA DA DEUSA MANI – 1
A personagem mais poderosa do jogo - “Mani, a força da natureza tupi em um corpo humano. Quando usa roupas perde seus poderes porque é a manifestação suprema de tudo o que é natural”. 


CARTA DO ASSUM PRETO – 2
“Tal como o pássaro de Luiz Gonzaga, Assum Preto tornou-se muito mais sensível e perceptivo após o acidente quântico que lhe custou a visão.

CARTA DO VISCONDE QUARESMA - 3
“Líder dos Heróis da Bruzundanga. Parente bem menos ingênuo do conhecido Policarpo Quaresma, ele tem um QI acima de 300 pontos e ama o Brasil tanto quanto seu ancestral”.

CARTA DE KALUANA DE ROUAN – 4
“Embaixador tupinista francês dos Heróis da Bruzuandanga na França, grande apreciador de cauim, más corre o boato de que é adepto do canibalismo”.

CARTA DE HUTEKLE BEN TAD - 5
“Assessor do serviço de inteligência e segurança de Sua Excelência o Manda-Cuva da Bruzundanga”. 

CARTA DE SUA EXCELÊNCIA O MANDA-CHUVA – 6
“O presidente da Bruzundanga, tratado por ‘manda-chuva’ e engajado na política através do sogro que o queria em um bom cargo para aos filhas”.

CARTA DA CEO DA FUJOSHI - 7
É a carta mais poderosa dos antagonistas. “Não se deixe enganar, apesar dos seus 16 anos, Fujoshi tem um QI tão alto quanto o de Quaresma. Seu lema é “A tecnologia militar não tem lado, más tem preço””. 

CARTA DO SR. LELÊ CULÊ - 8
“Sr. Lelê Culê, Ministro dos Títulos Soberanos da Bruzundanga e também é supeito de ser o contador dos Tuque-Tuque Fit-Fit.

CARTA DE YARA TUPI REREKOARA – 09
“Líder radical dos monges tupinistas, guardiões ancestrais do legado tupi, ressuscitam práticas canibais e se infiltram silenciosamente nas engrenagens do poder. 


CARTA DE INHAPUAMBUÇU - 19
"Morro sagrado dos tupi, com vida e personalidade próprias. Base do triângulo histórico de São Paulo, entre os rios Anhangabaú e Tamanduateí, atual bairro da Liberdade”.

CARTA DE ANHANGÁ - 20
“Deus tupi da caça e da natureza. De tamanho atroz, com olhos vermelhos da cor do fogo, ele vive no Vale do Anhangabaú”. 

CARTA DE ABAREBEBÉ – 21
Abarebebê é um padre jesuíta, piloto de caça cujo nome em tupi significa “o padre voador”, membro da família do histórico padre Leonardo Nunes”. 

CARTA DO DR. ABAPURÚ – 22
“Médico carismático que se tornou famoso na mídia por criar vacinas para diversas doenças desconhecidas. Suspeito de ser o homem por trás do ‘vírus da puberdade’”. 

CARTA DE HALAKANA BEN THORECA – 23
“Bióloga, cientista e freira, especializada na recuperação clonal de animais extintos. Ela ama seus mamutes, más ainda fornece a carne deles para a Tuque-Tuque Fit-Fit”.

CARTA DE TUQUE-TUQUE FIT-FIT – 24
“Sua Alteza Real, o Príncipe é uma figura mítica, muitos acreditam que ele criou métodos para alcançar a longevidade ao custo de vidas de escravos e de mamute”.

CARTA DE FELIXHIMINO BEN KARPATOSO – 25
“O homem mais rico da Bruzundanga. Um charlatão elegante que fala lindamente sobre finanças, mas não entende muito bem o assunto e cita autores estranhos e fictícios”.

HENGRÁCIA  BEN MANUELA KILVA – 26
Dona Hengrácia é esposa do Sr. Karpatoso que vem da roça e inventou para si mesma um título falso de nobreza, tal como Napoleão”.

JEFFERSON ARAMA – 27
Dizem que ele é filho de Mani e Assum Preto, muito inteligente, más também mimado e temperamental. Acostumado a se o centro das atenções por causa de sua beleza e poderes de semideus”. 


Cartas de Ação


CARTA CAUIM TIAKAU - 10
"Você ganhou poderes especiais dos Tupis. Todas as suas pontuações são dobradas (x 2) e você se torna imune à eliminação."
(Essa carta deve ser guardada até o final.)

CARTA TUKANAIRA MELVIN - 11
"Você ganhou poderes especiais dos Tupis. Todas as suas pontuações são aumentadas pela metade (x1,5). Elimine um jogador do jogo (inclusive a si mesmo, se desejar - Essa carta deve ser guardada até o final)."

CARTA IMPOSTO AO MANDACHUVA - 13
"Pague 3 Contas ao Manda Chuva. Se você o apoiou desde o início, receba 1 Conta como bônus."

CARTA DECOY DA MANI - 12
"Você foi enganado pela feiticeira Yara. Pague 3 Contas a ela."
Condições de Vitória.

CARTA BATALHA DE INSETOS - 16
“Batalha entre termites e formigas, vence quem pagou mais. Se o perdedor quiser pagar mais à Yara para ter um exército melhor, agora é a hora. Quem perder paga 3 Contas para o vencedor.

CARTA ASSUM TORANDO - 17
“Assum Preto te ajudou a vencer essa batalha, pague Três CONTAS a ele”.

CARTA EU SOU SUA COMIDA - 18
"Você foi capturado pelos Tupi Rerekoara. Será devorado e degustado com Cauim. Você está fora do jogo”.


CARTA NOBREZA DO PALPITE - 28
"Você se casou com a filha de alguém inportante de Bruzundanga, ganhou um título, um bom cargo de dobrou seu número de Contas".

CARTA VIAGEM DE QUARESMA - 29
"O Visconde de Quaresma teve que ir à uma reunião urgente em São Paulo, Pague sua passágem no valor de 2 Contas". 

CARTA COMPRAS DE MANI - 30
"Mani decidiu ir às compras na cidade de Bosomsy, na Bruzundanga, como é preciso agradá-la, você pagou suas compras no valor de 3 Contas". 

CARTA AULA DE TUPI 1 - 31
"Faça a pergunta e dê a resposta conjugando o verbo "comer. Se a sua pronúncia for boa, você ganhará 2 Contas". 

Pergunta: 
Mba'epe ereimonhang ko'yr é?
O que fazes agora?

Resposta:
ixé a-karú Eu como
endé ere-karú Tu comes
a'e o-karú Ele/ela come
oré oró-karú Nós comemos (exclusivo)
îandé îa-karú Nós comemos (inclusivo)
peẽ pe-karú Vós comestes
a'e o-karú Eles/elas comem

CARTA AULA DE TUPI 2 - 32
"Escolha um parceiro de jogo para fazer este diálogo, se a pronúnica for boa, ambos ganharão 1 Conta". 

Pergunta:
Marã pe ereikó, sé iru gûé (ió)?
Como você vai, irmão?

Resposta:
Xe kuarukasy nde resé.
Tenho a dor da tarde por sua causa (estou com saudade de você).

CARTA AULA DE TUPI 3 - 33
"Valendo uma Conta, adivinhe qual palavra vem depois da sequência de "tybas"(reuniões, ajuntamentos em tupi antigo)". 

Comanadatuba - ajuntamento de favas
Ibituba - cadeia de montanhas
Mandiotuba - mandiocal
Ananituba - plantação de abacaxi...

Caraguatatuba - anjuntamento de? 
Resposta:
 caraguás

CARTA FESTIVAL DO ANHANGÁ - 34
"Você foi escolhido para patrocinar as comemorações do Dia do Anhangá no Vale do Anhagabaú, no dia 17 de Julho. Pague 2 contas". 

CARTA CAIU A OCA - 35
"Você tinha um espião e ninguém sabia, infelizmente  ele foi pego. Pague a fiança de 2 Contas para que ele não dê com a língua nos dentes". 

CARTA OPORASEI - 36
"Oporaseî pysaré, oîempaîe angaipaba" - Dançaram a noite toda praticando feitiçaria — com isso você sairá vitorioso em todas as suas disputas. Guarde esta carta. 

Condições de Vitória

O jogo termina após a revelação de todas as Cartas de Ação ou quando o facilitador disser "última rodada".
O jogador com maior pontuação total ajustada (considerando atributos, Contas restantes e efeitos especiais) vence e recebe a garrafa de Cauim Tiakau.

sábado, 19 de abril de 2025

Cominatória: um filme dos Heróis da Bruzundanga


Mesmo com nosso primeiro Oscar para o filme Ainda Estou Aqui, com Fernanda Montenegro, acho que o cinema brasileiro ainda tem muito a evoluir — especialmente quando se trata de criar universos próprios, com personagens que inspirem orgulho, reflexão e pertencimento. Foi com esse sentimento que nasceu Cominatória, o filme live-action do meu HQ - Os Heróis da Bruzundanga com imágens criadas por IA mediante meu etilo artístico.

Na Bruzundanga (bem como no Brasil desta ficção), falam-se dois idiomas: o português e o tupi antigo e a bebida nacional brasileira é o cauim, exportado para todo o mundo. O cauim preferido de Mani é o Cauim Caraúna dos Tupi, o mais tradicional.

No livro Os Bruzundangas de 1922, Lima Barreto não menciona explicitamente um idioma diferente falado no país fictício da Bruzundanga. Na verdade, ele escreve como se o idioma fosse inguagem satírica, que bem pode ter sido o Protuguês, que imita a pomposidade e o burocratês das elites, criando um estilo que soa estranho e quase estrangeiro, exatamente para fazer uma crítica direta ao Brasil de sua época.

A Bruzundanga é uma alegoria do Brasil — e os personagens, instituições e costumes representados na obra são espelhos dos que existiam no país real. O autor usa essa nação inventada para satirizar a corrupção política, a incompetência administrativa, o bacharelismo exagerado e os vícios das elites brasileiras.

Em Bosomsy, capital de Bruzundnga, as pessoas se vestem como samoiedas, mesmo sendo um país tropical e muito quente. Carros voadores avançados de 2093 dividem as ruas e os céus com carros da década de 1950, demonstrando a distribuição desigual de renda.

Como sabem, Heróis da Bruzundanga é baseado nos livros de Lima Barreto — Triste Fim de Policarpo Quaresma e Os Bruzundangas. Em vez de simplesmente adaptar suas páginas, quis reimaginar aquele universo satírico e visionário com uma estética futurista e tropical, mantendo a alma crítica e irônica do autor. 

Líder dos Tupi Rerekoara escraviza os cidadãos doentes e ingênuos de Bruzundanga

Mani, Assum Preto e Quaresma não são apenas personagens. São símbolos de identidade e esperança em meio ao caos da Bruzundanga — um país que, mesmo fictício, nos diz muito sobre o Brasil real dos anos 1920, bem como dos dias de 2020.

Mais do que um filme, Cominatória é um convite para sonharmos com um cinema mais ousado, autoral e nosso.

Por Que Cominatória

"Cominatória" é uma palavra que vem do latim comminari, que significa "ameaçar". No português, ela tem dois sentidos principais:

Jurídico: é um tipo de advertência ou ameaça legal de punição ou penalidade, geralmente usada em sentenças. Ex: "pena cominatória" é uma multa que será aplicada se alguém não cumprir uma ordem judicial.

Visconde Quaresma, o descendente mais inteligente de Policarpo Quaresma, em encontro com os Mandacuva de Bruzundanga em 2094

Literário/Poético (menos comum): pode ser usada para indicar algo ameaçador, forte ou impositivo — como uma ação decisiva ou uma ruptura.
No contexto do seu filme Cominatória, o título carrega um peso simbólico interessante: pode sugerir um ultimato dos heróis contra a Bruzundanga corrompida, ou até uma ameaça de transformação — um chamado à mudança radical. Forte, dramático e provocador. 

Nos anos que antecedem o século 22, os carros respeitarão a estética que Prestes Maia inspirou nas ruas de São Paulo — por isso, o carro mais importado em Bruzundanga é o Modelo São Paulo 4000 de Luxe, Marca preferida de carros de Quaresma.

Trama

Num tempo de caos institucional, a Bruzundanga mergulha em trevas após um golpe de estado liderado pelos Tupi Rerekoara — uma ordem radical de monges tupinistas, guardiões ancestrais de uma cultura esquecida. Fanáticos por uma visão deturpada do legado Tupi, ressuscitam práticas canibalísticas e se infiltram silenciosamente nas engrenagens do poder, tomando o judiciário e passando leis que desafiam os valores mais básicos da civilização.

Mani, a força da natureza tupi encarnada em um corpo humano, não usa roupas porque é a manifestação suprema de tudo o que é natural, tem poderes sobre-humanos e conversa com diferentes consciências (animais, plantas e até minerais).

Chamados inicialmente para resolver um caso “menor” por Lelê Culê, Ministro dos Títulos Soberanos da Bruzundanga, suspeito de ser o contador dos Tuque Tuque Fit Fit, os Heróis da Bruzundanga — o gigante Assum Preto, a enigmática Mani e o perspicaz Quaresma — descobrem um plano sinistro de proporções globais: os Tupi Rerekoara desenvolveram uma toxina que inibe a infância e impede a puberdade dos adultos. A consequência? Uma sociedade inteira de corpos crescidos, mas com a ingenuidade de crianças — vulneráveis, manipuláveis e eternamente dependentes.

Tal como o pássaro da letra de Luis Gonzaga, Assum Preto ficou muito mais sensível e perceptivo após o acidente que lhe custou a visão - todos seus ímpetos parecem ter crescido a novas dimensões, seu lado de cangaceiro selvagem não foi exceção. 

O roteiro mistura sátira política, ficção distópica e ação alucinante, revelando como a Bruzundanga, apesar de tão antiga quanto o planeta, nunca encontrou sossego para os seus verdadeiros filhos.

Formigas Versus Cupins (Termitas)

A Fujoshi (テクノロジー腐女子) é uma mega corporação bélica e tecnológica do final do século 21, especializada na produção de soldados aumentados — híbridos entre humanos e máquinas — criados para operar em ambientes extremos e guerras prolongadas. Seu slogan não oficial é conhecido em todos os fronts de batalha: “Tecnologia não tem lado, más tem preço.”

General Termita, com tecnologia Fujoshi - luta pelos interesses do Brasil e Da Bruzundanga

Na linha de frente dos conflitos da Bruzundanga, a Fujoshi fornece seus icônicos Soldados Termitas aos aliados do regime, guerreiros implacáveis com exoesqueletos reforçados, armaduras segmentadas e capacetes de tecnologia avançada que permitem visão total em todo o espectro eletromagnético — do infravermelho ao ultravioleta. Eles se destacam em combate urbano, subterrâneo e infiltrado, inspirados na organização das verdadeiras colônias de cupins (Termitas).

Ao mesmo tempo, por trás das sombras diplomáticas, a empresa também abastece os Soldados Formigas, enviados aos exércitos inimigos. Suas armaduras prateadas e brancas refletem a luz do dia, simbolizando a frieza com que marcham para o campo de batalha. A eficiência da tropa é amplificada por sensores integrados, módulos de força sincronizada e comandos neurais coordenados via rede de comunicação tática da própria Fujoshi.

Exército "Colonia" de Fromigas - também de tecnologia Fujoshi - inimigos da Bruzundanga

No centro de tudo está o enigmático Sr. Fujoshi, CEO e idealizador do conglomeado de empresas. Ele opera como um maestro das guerras modernas, decidindo quais exércitos recebem as últimas atualizações — e quais ficam com o que sobra. Suas decisões não seguem ideologias, apenas contratos.

Enquanto a guerra devasta a Bruzundanga, a Fujoshi prospera — alimentando os dois lados, promovendo um equilíbrio instável onde o verdadeiro vencedor é sempre o fornecedor.

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Quaresma, Assum e Mani retornam para enfrentar não apenas um exército, mas uma ideia — a de que a paz é uma mercadoria e a infância, uma toxina a ser eliminada.

A São Paulo de 2093 mudou muito com a prosperidade gerada pelas reformas políticas e econômicas de Quaresma (na imagem vemos seu carro no Vale do Anhangabaú), mas seu centro histórico ainda tem suas características preservadas, até mesmo o morro do Inhapumabuçu foi restaurado em seu local original, no bairro da liberdade, a pedido dos tupinistas da seita Tupi Rerekoara.

Em meio ao caos, ecoa a lembrança de um velho patriota:

“Veio-lhe então à lembrança aquela frase de Saint-Hilaire: se nós não expulsássemos as formigas, elas nos expulsariam. [...] a fazer esforços de sagacidade, para descobrir os redutos centrais, as ‘panelas’ dos insetos terríveis. Então era como se os bombardeassem; o sulfeto queimava, estourava em tiros seguidos, mortíferos, letais.”

— Lima Barreto, Triste Fim de Policarpo Quaresma, 1915.

O Cauim

Encerrando essa jornada cinematográfica por uma Bruzundanga reinventada — entre soldados aumentados, tradições subvertidas e heróis improváveis —, celebramos também aquilo que nos torna únicos. Nesses países de outra realidade, mas bem próxima da nossa, o mundo se delicia com uma iguaria brasileira sem igual: o cauim. Com tantas variedades quanto as etnias que o produzem — cauim dos Waurás, dos Tupi, dos Yanomami — são mais de 300 tipos diferentes que se multiplicam por várias marcas e categorias, que carregam histórias, num universo de ritos e sabores próprios. As vésperas do seculo XXII essas marcas singulares conquistam o paladar global com a mesma reverência dedicada ao saquê japonês ou aos vinhos franceses e italianos. 

T’ereikokatu!

O Parque Indígena do Xingu PIX

  Para evidenciar a riqueza da nossa cultura ancestral, despertar o interesse dos jovens estudantes e evitar estigmatizar indivíduos, decidi...