segunda-feira, 28 de abril de 2025

RPG dos Heróis da Bruzundanga - Gamificação Para Aculturamento do Cauim Tiakau

Visconde de Quaresma servindo Cauim Carauna em sua mansão, réplica idêntica do Museu do Ipiranga no Rio de Janeiro

Uma aventura tupi-canibal para divulgar o Cauim Tiakau

RPG e Gameficação

O objetivo deste artigo é analisar os efeitos da gamificação como estratégia de aculturação para o Cauim Tiakau, utilizando um jogo de RPG baseado nos Heróis da Bruzundanga, bem como apresentar o jogo e sua dinâmica. 

A trama se passa em um futuro alternativo do Brasil, masi exatamente no ano de 2093, onde e quando a cultura tupi é amplamente valorizada e o país alcançou um nível elevado de prosperidade.

A gamificação no marketing é uma abordagem eficaz que transforma interações cotidianas com a marca em experiências divertidas e engajadoras. Ela consiste em aplicar elementos de design de jogos — como pontos, distintivos e desafios — às atividades de marketing, estimulando o envolvimento e a fidelização.

Dentro do jogo, há uma etapa especial de degustação de cauim, na qual os participantes experimentam a bebida enquanto aprendem sobre seu processo de produção tradicional com nomenclaturas em tupi antigo. Esse momento é integrado à narrativa de forma a reforçar o contexto histórico e cultural da bebida, promovendo a valorização das raízes indígenas brasileiras.

 


Base de Estratégia

Para criar a dinâmica do jogo, foi necessário um extenso processo de estudo e pesquisa. Não apenas resgatei minha experiência prática com jogos de RPG, que tive na virada dos anos 2000, como também mergulhei no estudo dos principais teóricos de gamificação aplicada ao marketing. Essa base teórica e prática foi essencial para estruturar uma experiência que fosse, ao mesmo tempo, divertida, envolvente e alinhada aos objetivos de aculturação e valorização cultural do projeto Cauim Tiakau.

Aqui estão três autores cujos trabalhos em gamificação se aproximam bastante da proposta do Cauim Rerekoara, especialmente por envolverem narrativas envolventes, experiências culturais imersivas e interação social significativa:

1. Gabe Zichermann

Obra principal: Gamification by Design

Relevância: Zichermann é um dos principais nomes da gamificação. Ele destaca o uso de jogos para engajar pessoas emocionalmente, algo essencial no seu projeto, que une storytelling, identidade cultural e participação ativa.

2. Jane McGonigal

Obra principal: Reality is Broken

Relevância: Jane defende que jogos podem ser usados para melhorar o mundo real. O seu jogo, que resgata o cauim e a história dos povos originários, está diretamente alinhado com essa ideia de experiência transformadora com impacto cultural.

3. Sebastian Deterding

Obra principal: Diversos artigos sobre gameful design e experiências significativas

Relevância: Deterding se aprofunda em como criar experiências com significado e imersão. Ele defende que jogos precisam ter coerência com o contexto cultural e emocional do jogador, algo que você já aplica ao conectar o jogo com os Heróis da Bruzundanga e o cauim.

Além do live action (veja post anterior), um jogo de RPG com os personagens pode ser uma opção para divulgar a cultura tupi, o cauim e prinicpalmente o idioma tupi antigo. Os idiomas indígenas como a língua geral paulistana, a língua brasílica, o nheengatu, entre outras variações do tupi antigo, eram as mais faladas em todo o território brasileiro, enquanto a língua portuguesa era minoritária, falada apenas por europeus, até a proibição das línguas indígenas pelo Marquês de Pombal,  em seu diretório de 3 de maio de 1757. 

Este diretório buscava não apenas corrigir o inócuo decreto de 7 de junho de 1755, que havia transferido a jurisdição temporal para os próprios chefes indígenas, mas também determinar visivelmente a expulsão dos jesuítas, particularmente visados ​​por este documento. Uma vez confirmado e convertido em lei pelo decreto de 17 de agosto de 1758, o ensino do português e do tupi nas missões jesuíticas foi proibido.

Dessa forma, a produção do Cauim, o estudo do idioma Tupi Antigo, bem como todas as formas de resgate cultural, tornaram-se, desde então, ferramentas de valorização cultural e autodeterminação nacional.

Tabuleiro do Jogo
Objetivo do Jogo

Este é um jogo de RPG com fins de gamificação e degustação para promover o Cauim Tiakau, uma bebida ancestral renascida com propósito.
No final da partida, o jogador vencedor recebe como prêmio uma garrafa de Cauim Tiakau.

Formato

Jogadores: de 12 a 50 participantes
Duração: aproximadamente 1 hora
Estilo: Role-Playing Game (RPG) com cartas e narrativa interativa
Temática: sátira política, misticismo tupi e combate simbólico entre civilização e barbárie

Materiais

50 Cartas de Personalidade
Cada carta apresenta 4 atributos com pontuação de 1 a 20:
Potência em Batalha
Capacidade de Defesa
Inteligência
Equilíbrio Emocional

3 Cartas de Roteiro (com a trama central da sessão)
10 Cartas de Ação (eventos aleatórios que alteram o jogo)
Muitas peças de GO (utilizadas como valor monetário — chamadas de “Contas”)
Cada jogador começa com 10 Contas

Fase 1: Preparação

Cada jogador recebe uma Carta de Personalidade, dividida entre Protagonistas (heróis) e Antagonistas (vilões) em número equilibrado.

Caso o jogador não goste da carta, pode trocar uma única vez.

As personalidades são explicadas na apresentação inicial.
Apresenta-se o contexto histórico e cultural do Cauim Tiakau, Os Bruzundangas e associação com obras de Lima Barreto, sua origem e importância.

Divide-se a sala em dois grandes grupos: Protagonistas e Antagonistas.

Fase 2: Apresentação do Roteiro

Exemplo de roteiro para a primeira partida:

Trama – A Toxina da Infância Eterna
A Bruzundanga vive o caos. Após um golpe de estado, os fanáticos da ordem secreta Tupi Rerekoara tomam o poder. Eles revivem práticas canibais, tomam o judiciário e impõem uma toxina misteriosa que impede a puberdade — criando uma população de adultos infantilizados e controláveis.

Os heróis Assum Preto, Mani e Quaresma são convocados para investigar o plano, iniciando uma jornada que revelará segredos profundos sobre poder, ancestralidade e manipulação de consciências.

Fase 3: Escolhas Táticas

Os jogadores se organizam em grupos de acordo com suas cartas:

Ex: Quem tirou Quaresma (carta 03) lidera os protagonistas.
Quem tirou Yara (carta 09) lidera os antagonistas.

Cada grupo decide em conjunto quem revelará a próxima Carta de Ação.

O grupo dos antagonistas escolhe seu exército secreto (Ex: Exército Formiga Fujoshi).

Aqui, os grupos escolhem secretamente quanto pagarão a Fujoshi, em valores que podem variar de 2 a 10 CONTAS. As disputas sempre serão vencidas pelo exército que pagar mais. Se o grupo que se sente oprimido decidir pagar mais a Fujoshi, poderá fazê-lo. Quem paga mais sempre vence.

O personagem “Manda Chuva” contrata Quaresma, pagando 5 Contas.

O pagamento pode vir do próprio bolso ou por meio de doações de aliados.

Cartas das Personalidades Principais


CARTA DA DEUSA MANI – 1
A personagem mais poderosa do jogo - “Mani, a força da natureza tupi em um corpo humano. Quando usa roupas perde seus poderes porque é a manifestação suprema de tudo o que é natural”. 


CARTA DO ASSUM PRETO – 2
“Tal como o pássaro de Luiz Gonzaga, Assum Preto tornou-se muito mais sensível e perceptivo após o acidente quântico que lhe custou a visão.

CARTA DO VISCONDE QUARESMA - 3
“Líder dos Heróis da Bruzundanga. Parente bem menos ingênuo do conhecido Policarpo Quaresma, ele tem um QI acima de 300 pontos e ama o Brasil tanto quanto seu ancestral”.

CARTA DE KALUANA DE ROUAN – 4
“Embaixador tupinista francês dos Heróis da Bruzuandanga na França, grande apreciador de cauim, más corre o boato de que é adepto do canibalismo”.

CARTA DE HUTEKLE BEN TAD - 5
“Assessor do serviço de inteligência e segurança de Sua Excelência o Manda-Cuva da Bruzundanga”. 

CARTA DE SUA EXCELÊNCIA O MANDA-CHUVA – 6
“O presidente da Bruzundanga, tratado por ‘manda-chuva’ e engajado na política através do sogro que o queria em um bom cargo para aos filhas”.

CARTA DA CEO DA FUJOSHI - 7
É a carta mais poderosa dos antagonistas. “Não se deixe enganar, apesar dos seus 16 anos, Fujoshi tem um QI tão alto quanto o de Quaresma. Seu lema é “A tecnologia militar não tem lado, más tem preço””. 

CARTA DO SR. LELÊ CULÊ - 8
“Sr. Lelê Culê, Ministro dos Títulos Soberanos da Bruzundanga e também é supeito de ser o contador dos Tuque-Tuque Fit-Fit.

CARTA DE YARA TUPI REREKOARA – 09
“Líder radical dos monges tupinistas, guardiões ancestrais do legado tupi, ressuscitam práticas canibais e se infiltram silenciosamente nas engrenagens do poder. 


CARTA DE INHAPUAMBUÇU - 19
"Morro sagrado dos tupi, com vida e personalidade próprias. Base do triângulo histórico de São Paulo, entre os rios Anhangabaú e Tamanduateí, atual bairro da Liberdade”.

CARTA DE ANHANGÁ - 20
“Deus tupi da caça e da natureza. De tamanho atroz, com olhos vermelhos da cor do fogo, ele vive no Vale do Anhangabaú”. 

CARTA DE ABAREBEBÉ – 21
Abarebebê é um padre jesuíta, piloto de caça cujo nome em tupi significa “o padre voador”, membro da família do histórico padre Leonardo Nunes”. 

CARTA DO DR. ABAPURÚ – 22
“Médico carismático que se tornou famoso na mídia por criar vacinas para diversas doenças desconhecidas. Suspeito de ser o homem por trás do ‘vírus da puberdade’”. 

CARTA DE HALAKANA BEN THORECA – 23
“Bióloga, cientista e freira, especializada na recuperação clonal de animais extintos. Ela ama seus mamutes, más ainda fornece a carne deles para a Tuque-Tuque Fit-Fit”.

CARTA DE TUQUE-TUQUE FIT-FIT – 24
“Sua Alteza Real, o Príncipe é uma figura mítica, muitos acreditam que ele criou métodos para alcançar a longevidade ao custo de vidas de escravos e de mamute”.

CARTA DE FELIXHIMINO BEN KARPATOSO – 25
“O homem mais rico da Bruzundanga. Um charlatão elegante que fala lindamente sobre finanças, mas não entende muito bem o assunto e cita autores estranhos e fictícios”.

HENGRÁCIA  BEN MANUELA KILVA – 26
Dona Hengrácia é esposa do Sr. Karpatoso que vem da roça e inventou para si mesma um título falso de nobreza, tal como Napoleão”.

JEFFERSON ARAMA – 27
Dizem que ele é filho de Mani e Assum Preto, muito inteligente, más também mimado e temperamental. Acostumado a se o centro das atenções por causa de sua beleza e poderes de semideus”. 


Cartas de Ação


CARTA CAUIM TIAKAU - 10
"Você ganhou poderes especiais dos Tupis. Todas as suas pontuações são dobradas (x 2) e você se torna imune à eliminação."
(Essa carta deve ser guardada até o final.)

CARTA TUKANAIRA MELVIN - 11
"Você ganhou poderes especiais dos Tupis. Todas as suas pontuações são aumentadas pela metade (x1,5). Elimine um jogador do jogo (inclusive a si mesmo, se desejar - Essa carta deve ser guardada até o final)."

CARTA IMPOSTO AO MANDACHUVA - 13
"Pague 3 Contas ao Manda Chuva. Se você o apoiou desde o início, receba 1 Conta como bônus."

CARTA DECOY DA MANI - 12
"Você foi enganado pela feiticeira Yara. Pague 3 Contas a ela."
Condições de Vitória.

CARTA BATALHA DE INSETOS - 16
“Batalha entre termites e formigas, vence quem pagou mais. Se o perdedor quiser pagar mais à Yara para ter um exército melhor, agora é a hora. Quem perder paga 3 Contas para o vencedor.

CARTA ASSUM TORANDO - 17
“Assum Preto te ajudou a vencer essa batalha, pague Três CONTAS a ele”.

CARTA EU SOU SUA COMIDA - 18
"Você foi capturado pelos Tupi Rerekoara. Será devorado e degustado com Cauim. Você está fora do jogo”.


CARTA NOBREZA DO PALPITE - 28
"Você se casou com a filha de alguém inportante de Bruzundanga, ganhou um título, um bom cargo de dobrou seu número de Contas".

CARTA VIAGEM DE QUARESMA - 29
"O Visconde de Quaresma teve que ir à uma reunião urgente em São Paulo, Pague sua passágem no valor de 2 Contas". 

CARTA COMPRAS DE MANI - 30
"Mani decidiu ir às compras na cidade de Bosomsy, na Bruzundanga, como é preciso agradá-la, você pagou suas compras no valor de 3 Contas". 

CARTA AULA DE TUPI 1 - 31
"Faça a pergunta e dê a resposta conjugando o verbo "comer. Se a sua pronúncia for boa, você ganhará 2 Contas". 

Pergunta: 
Mba'epe ereimonhang ko'yr é?
O que fazes agora?

Resposta:
ixé a-karú Eu como
endé ere-karú Tu comes
a'e o-karú Ele/ela come
oré oró-karú Nós comemos (exclusivo)
îandé îa-karú Nós comemos (inclusivo)
peẽ pe-karú Vós comestes
a'e o-karú Eles/elas comem

CARTA AULA DE TUPI 2 - 32
"Escolha um parceiro de jogo para fazer este diálogo, se a pronúnica for boa, ambos ganharão 1 Conta". 

Pergunta:
Marã pe ereikó, sé iru gûé (ió)?
Como você vai, irmão?

Resposta:
Xe kuarukasy nde resé.
Tenho a dor da tarde por sua causa (estou com saudade de você).

CARTA AULA DE TUPI 3 - 33
"Valendo uma Conta, adivinhe qual palavra vem depois da sequência de "tybas"(reuniões, ajuntamentos em tupi antigo)". 

Comanadatuba - ajuntamento de favas
Ibituba - cadeia de montanhas
Mandiotuba - mandiocal
Ananituba - plantação de abacaxi...

Caraguatatuba - anjuntamento de? 
Resposta:
 caraguás

CARTA FESTIVAL DO ANHANGÁ - 34
"Você foi escolhido para patrocinar as comemorações do Dia do Anhangá no Vale do Anhagabaú, no dia 17 de Julho. Pague 2 contas". 

CARTA CAIU A OCA - 35
"Você tinha um espião e ninguém sabia, infelizmente  ele foi pego. Pague a fiança de 2 Contas para que ele não dê com a língua nos dentes". 

CARTA OPORASEI - 36
"Oporaseî pysaré, oîempaîe angaipaba" - Dançaram a noite toda praticando feitiçaria — com isso você sairá vitorioso em todas as suas disputas. Guarde esta carta. 

Condições de Vitória

O jogo termina após a revelação de todas as Cartas de Ação ou quando o facilitador disser "última rodada".
O jogador com maior pontuação total ajustada (considerando atributos, Contas restantes e efeitos especiais) vence e recebe a garrafa de Cauim Tiakau.

sábado, 19 de abril de 2025

Cominatória: um filme dos Heróis da Bruzundanga


Mesmo com nosso primeiro Oscar para o filme Ainda Estou Aqui, com Fernanda Montenegro, acho que o cinema brasileiro ainda tem muito a evoluir — especialmente quando se trata de criar universos próprios, com personagens que inspirem orgulho, reflexão e pertencimento. Foi com esse sentimento que nasceu Cominatória, o filme live-action do meu HQ - Os Heróis da Bruzundanga com imágens criadas por IA mediante meu etilo artístico.

Na Bruzundanga (bem como no Brasil desta ficção), falam-se dois idiomas: o português e o tupi antigo e a bebida nacional brasileira é o cauim, exportado para todo o mundo. O cauim preferido de Mani é o Cauim Caraúna dos Tupi, o mais tradicional.

No livro Os Bruzundangas de 1922, Lima Barreto não menciona explicitamente um idioma diferente falado no país fictício da Bruzundanga. Na verdade, ele escreve como se o idioma fosse inguagem satírica, que bem pode ter sido o Protuguês, que imita a pomposidade e o burocratês das elites, criando um estilo que soa estranho e quase estrangeiro, exatamente para fazer uma crítica direta ao Brasil de sua época.

A Bruzundanga é uma alegoria do Brasil — e os personagens, instituições e costumes representados na obra são espelhos dos que existiam no país real. O autor usa essa nação inventada para satirizar a corrupção política, a incompetência administrativa, o bacharelismo exagerado e os vícios das elites brasileiras.

Em Bosomsy, capital de Bruzundnga, as pessoas se vestem como samoiedas, mesmo sendo um país tropical e muito quente. Carros voadores avançados de 2093 dividem as ruas e os céus com carros da década de 1950, demonstrando a distribuição desigual de renda.

Como sabem, Heróis da Bruzundanga é baseado nos livros de Lima Barreto — Triste Fim de Policarpo Quaresma e Os Bruzundangas. Em vez de simplesmente adaptar suas páginas, quis reimaginar aquele universo satírico e visionário com uma estética futurista e tropical, mantendo a alma crítica e irônica do autor. 

Líder dos Tupi Rerekoara escraviza os cidadãos doentes e ingênuos de Bruzundanga

Mani, Assum Preto e Quaresma não são apenas personagens. São símbolos de identidade e esperança em meio ao caos da Bruzundanga — um país que, mesmo fictício, nos diz muito sobre o Brasil real dos anos 1920, bem como dos dias de 2020.

Mais do que um filme, Cominatória é um convite para sonharmos com um cinema mais ousado, autoral e nosso.

Por Que Cominatória

"Cominatória" é uma palavra que vem do latim comminari, que significa "ameaçar". No português, ela tem dois sentidos principais:

Jurídico: é um tipo de advertência ou ameaça legal de punição ou penalidade, geralmente usada em sentenças. Ex: "pena cominatória" é uma multa que será aplicada se alguém não cumprir uma ordem judicial.

Visconde Quaresma, o descendente mais inteligente de Policarpo Quaresma, em encontro com os Mandacuva de Bruzundanga em 2094

Literário/Poético (menos comum): pode ser usada para indicar algo ameaçador, forte ou impositivo — como uma ação decisiva ou uma ruptura.
No contexto do seu filme Cominatória, o título carrega um peso simbólico interessante: pode sugerir um ultimato dos heróis contra a Bruzundanga corrompida, ou até uma ameaça de transformação — um chamado à mudança radical. Forte, dramático e provocador. 

Nos anos que antecedem o século 22, os carros respeitarão a estética que Prestes Maia inspirou nas ruas de São Paulo — por isso, o carro mais importado em Bruzundanga é o Modelo São Paulo 4000 de Luxe, Marca preferida de carros de Quaresma.

Trama

Num tempo de caos institucional, a Bruzundanga mergulha em trevas após um golpe de estado liderado pelos Tupi Rerekoara — uma ordem radical de monges tupinistas, guardiões ancestrais de uma cultura esquecida. Fanáticos por uma visão deturpada do legado Tupi, ressuscitam práticas canibalísticas e se infiltram silenciosamente nas engrenagens do poder, tomando o judiciário e passando leis que desafiam os valores mais básicos da civilização.

Mani, a força da natureza tupi encarnada em um corpo humano, não usa roupas porque é a manifestação suprema de tudo o que é natural, tem poderes sobre-humanos e conversa com diferentes consciências (animais, plantas e até minerais).

Chamados inicialmente para resolver um caso “menor” por Lelê Culê, Ministro dos Títulos Soberanos da Bruzundanga, suspeito de ser o contador dos Tuque Tuque Fit Fit, os Heróis da Bruzundanga — o gigante Assum Preto, a enigmática Mani e o perspicaz Quaresma — descobrem um plano sinistro de proporções globais: os Tupi Rerekoara desenvolveram uma toxina que inibe a infância e impede a puberdade dos adultos. A consequência? Uma sociedade inteira de corpos crescidos, mas com a ingenuidade de crianças — vulneráveis, manipuláveis e eternamente dependentes.

Tal como o pássaro da letra de Luis Gonzaga, Assum Preto ficou muito mais sensível e perceptivo após o acidente que lhe custou a visão - todos seus ímpetos parecem ter crescido a novas dimensões, seu lado de cangaceiro selvagem não foi exceção. 

O roteiro mistura sátira política, ficção distópica e ação alucinante, revelando como a Bruzundanga, apesar de tão antiga quanto o planeta, nunca encontrou sossego para os seus verdadeiros filhos.

Formigas Versus Cupins (Termitas)

A Fujoshi (テクノロジー腐女子) é uma mega corporação bélica e tecnológica do final do século 21, especializada na produção de soldados aumentados — híbridos entre humanos e máquinas — criados para operar em ambientes extremos e guerras prolongadas. Seu slogan não oficial é conhecido em todos os fronts de batalha: “Tecnologia não tem lado, más tem preço.”

General Termita, com tecnologia Fujoshi - luta pelos interesses do Brasil e Da Bruzundanga

Na linha de frente dos conflitos da Bruzundanga, a Fujoshi fornece seus icônicos Soldados Termitas aos aliados do regime, guerreiros implacáveis com exoesqueletos reforçados, armaduras segmentadas e capacetes de tecnologia avançada que permitem visão total em todo o espectro eletromagnético — do infravermelho ao ultravioleta. Eles se destacam em combate urbano, subterrâneo e infiltrado, inspirados na organização das verdadeiras colônias de cupins (Termitas).

Ao mesmo tempo, por trás das sombras diplomáticas, a empresa também abastece os Soldados Formigas, enviados aos exércitos inimigos. Suas armaduras prateadas e brancas refletem a luz do dia, simbolizando a frieza com que marcham para o campo de batalha. A eficiência da tropa é amplificada por sensores integrados, módulos de força sincronizada e comandos neurais coordenados via rede de comunicação tática da própria Fujoshi.

Exército "Colonia" de Fromigas - também de tecnologia Fujoshi - inimigos da Bruzundanga

No centro de tudo está o enigmático Sr. Fujoshi, CEO e idealizador do conglomeado de empresas. Ele opera como um maestro das guerras modernas, decidindo quais exércitos recebem as últimas atualizações — e quais ficam com o que sobra. Suas decisões não seguem ideologias, apenas contratos.

Enquanto a guerra devasta a Bruzundanga, a Fujoshi prospera — alimentando os dois lados, promovendo um equilíbrio instável onde o verdadeiro vencedor é sempre o fornecedor.

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Quaresma, Assum e Mani retornam para enfrentar não apenas um exército, mas uma ideia — a de que a paz é uma mercadoria e a infância, uma toxina a ser eliminada.

A São Paulo de 2093 mudou muito com a prosperidade gerada pelas reformas políticas e econômicas de Quaresma (na imagem vemos seu carro no Vale do Anhangabaú), mas seu centro histórico ainda tem suas características preservadas, até mesmo o morro do Inhapumabuçu foi restaurado em seu local original, no bairro da liberdade, a pedido dos tupinistas da seita Tupi Rerekoara.

Em meio ao caos, ecoa a lembrança de um velho patriota:

“Veio-lhe então à lembrança aquela frase de Saint-Hilaire: se nós não expulsássemos as formigas, elas nos expulsariam. [...] a fazer esforços de sagacidade, para descobrir os redutos centrais, as ‘panelas’ dos insetos terríveis. Então era como se os bombardeassem; o sulfeto queimava, estourava em tiros seguidos, mortíferos, letais.”

— Lima Barreto, Triste Fim de Policarpo Quaresma, 1915.

O Cauim

Encerrando essa jornada cinematográfica por uma Bruzundanga reinventada — entre soldados aumentados, tradições subvertidas e heróis improváveis —, celebramos também aquilo que nos torna únicos. Nesses países de outra realidade, mas bem próxima da nossa, o mundo se delicia com uma iguaria brasileira sem igual: o cauim. Com tantas variedades quanto as etnias que o produzem — cauim dos Waurás, dos Tupi, dos Yanomami — são mais de 300 tipos diferentes que se multiplicam por várias marcas e categorias, que carregam histórias, num universo de ritos e sabores próprios. As vésperas do seculo XXII essas marcas singulares conquistam o paladar global com a mesma reverência dedicada ao saquê japonês ou aos vinhos franceses e italianos. 

T’ereikokatu!

RPG dos Heróis da Bruzundanga - Gamificação Para Aculturamento do Cauim Tiakau

Visconde de Quaresma servindo Cauim Carauna em sua mansão, réplica idêntica do Museu do Ipiranga no Rio de Janeiro Uma aventura tupi-canibal...