sábado, 23 de março de 2024

Solana Star, Verão da Lata, Litoral Paulista e Carioca de 1987 a 1988

 

Essa é a história verídica de um navio que, ameaçado pela polícia, despeja 22 toneladas de latas contendo maconha no litoral brasileiro em Ubatuba, próximo às praias Grande, do Tenório e das Toninhas, e acaba soando como mentira de pescador, ou mesmo, conto de surfista.

Dizem que o Brasil é o lugar onde tudo acontece.. e é verdade


Tudo começou em agosto de 1987, quando o delegado de polícia federal Antônio Carlos Rayol e Carlos Mandim de Oluveira receberam um comunicado do DEA americano, o Drug Enforcement Administration, informando que um navio que havia partido de Singapura, o Solana Star de bandeira panamenha, com um grande carregamento de maconha se destinava ao Brasil, com destino final em Miami. Eram 22 toneladas de maconha embaladas a vácuo em latas de 1,5kg. 

O mandante da operação foi um criminoso de Aspen, no Colorado, que já havia patrocinado uma outra viágem antes desta, partindo do Panamá e seguindo para as Filipinas, via Vietnã, com um carregamento intorpecentes para Los Angeles.

Como o navio não foi capturado, a operação havia sido bem sucedida e muito lucrativa, o mandante ordenou uma segunda viagem, comandada pelo mesmo capitão de nome Archibald, que desta vez faria uma nova rota. 

Comporu um novo barco na Austrália, um atuneiro chamado Solana Star de 41m x 7m x 3m, capaz de deslocar 540 toneladas, com motor diesel de 1.500 HP e dois auxiliares de 350 HP. Rumou com seu novo barco para Bangkok, via Japão, onde o carregou a mercadoria, maconha acondicionada em latas de suco de toranja, de uma marca de fachada chamada “Berri”, criada especialmente para a operação. 

Uma vez carregado com as latas, dirigiu-se ao sul, pelo mar do Sul da China, com destino ao Rio de Janeiro.

Suco de Toranja Berri - marca fictícia das latas do verão de 1987

Caça Ao Solana Star e Operação Cata-latas

No dia 8 de agosto de 1987, às 10:00hs, saiu do porto do Rio de Janeiro a primeira missão de caça, a bordo de uma fragata da marinha brasileira em parceria com o DEA.  A operação não foi bem sucedida, pois o navio ainda não havia chegado em àguas territoriais brasileiras, estava no meio do atlantico devido a duas tempestades que acometeram o navio no meio do Atlântico.

Novos acontecimentos deram origem a uma nova operação de caça, devido à prisão em Miami do mandante do tráfico quando tentava embarcar em voo para o Rio de Janeiro. A inteligência da DEA indicou que a mercadoria deveria ser transferida para outra embarcação no litoral da Ilha Grande, no Rio de Janeiro.

Mais uma vez o delegado Mandim organizou uma operação policial em 28 de agosto de 1987, desta vez, fizeram uso do contratorpedeiro Sergipe, emprestada pela Marinha do Brasil - novamente a operação não teve sucesso.

Como aquelas latas foram parar nas praias?

O desfecho mais interessante surge com um relato do jornal A Tribuna de Santos no dia 19 de setembro de 1987, dizendo que no Guarujá, quando um varredor de rua que coletava lixo na praia das Astúrias se deparou com uma grande lata fechada, movendo-se para frente e para trás na espuma das ondas. Outras latas começaram a ser encontradas por pescadores no litoral de Guarjuá, Ubatuba e Ilha Bela, mais tarde, levadas pela maré começou a chegar também no Rio de Janeiro. Imediatamente iniciou-se um comércio clandestino das latas e seus conteúdos, promovida principalmente por pescadores que escondiam as latas em caixas de isopor cheias de peixes, sendo uma contravenção muito mais lucrativa do que a pesca.

No dia 14 de setembro, os tripulantes do Solano Star, foram avisados que a Policia Federal e a Marinha do Brasil e o DEA já sabiam da carga de maconha que estava a bordo, com medo de serem presos, os tripulantes - cinco americanos, um haitiano e um costarriquenho, despejaram as cerca de 15 mil latas contendo maconha no mar, e o episódio passou a ser chamado de "Verão da Lata", marcado na história brasileira.

Tripulação do Solana Star joga latas de maconha no mar

A história ganhou destaque na mídia e causou uma corrida entre curiosos e autoridades para ver quem as encontrasse primeiro, o fato de a maconha estar embalada em latas de metal semelhantes às de leite em pó tornou a situação ainda mais inusitada.

Solana Star despejando as latas no mar

Logo a situação ficou muito popular e cômica, alguns diziam que a lata, assim como acontecia com o marinheiro Popeye, mudava a realidade, trazendo poderes especiais à aqueles que as consumisse. Outros disseram que os contidos nas latas eram considerados de qualidade superior a qualquer outra coisa jamais vista. A história ficou tão marcante que inspirou livros, músicas e até mesmo uma mística sobre o assunto, no qual featas eram dadas com um ritual de abertura de latas em homenagem à qualidade do produto era realizado.

Apesar dos esforços das autoridades para apreender as latas e investigar o caso, apenas uma pequena fração foi recuperada pela polícia, pois sua grande maioria foi encontrada por banhistas e pescadores e posteriormente comercializada.

A Polícia Federal conseguiu recuperar 3.292 doses. Caso o produto final tivesse chegado aos traficantes de Miami, estima-se que a operação teria rendido US$ 90 milhões.

Desfecho

Dos sete tripulantes, seis escaparam pelo aeroporto do Galeão dois dias após chegarem ao Rio. Apenas o cozinheiro americano Stephen Skelton foi preso e condenado a 20 anos de prisão, mas cumpriu apenas um ano no Brasil antes de ser extraditado. O navio envolvido no incidente foi apreendido e posteriormente leiloado, o Solana Star acabou sendo vendido após a conclusão da perícia no caso relacionado ao contrabando de maconha. Seu nome foi alterado para Charles Henri e, finalmente, Tunamar II, quando pertenceu à uma empresa japonesa de pesca de atum. 

O cozinheiro americano Stephen Skelton foi preso

Estranhamente, o destino da embarcação estava ligado às àguas brasileiras. No dia de outubro de 1994 encontrou seu trágico final, naufragando a 8 milhas náuticas do Arraial do Cabo, no litoral do Rio de Janeiro (22º59'240"S / 41º57'250"O), resultando na morte de 11 tripulantes.

Em 2012, foi lançado o livro “O Verão da Lata: Um verão que ninguém esqueceu”, do escritor Wilson Aquino que aborda o assunto.

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